domingo, 11 de novembro de 2007

Sunitas, Xiitas, Califados e o Direito Muçulmano.

Maysa Espíndola Souza




Maomé foi, além de um líder religioso, um líder político e militar. Após a sua morte, em 632 d.C., iniciou-se os primeiros cismas do mundo muçulmano. A religião fundada pelo profeta foi conhecida durante muitos anos, no Ocidente, por “maometanismo”. Como Maomé morreu sem designar seu sucessor manifestaram-se duas correntes que ainda hoje lutam pelo poder, a ordem xiita (“Shiat Ali” – seguidores de Ali, em árabe) e a ordem sunita (“Sunat Anabi” – tradição do profeta, em árabe).
Para os xiitas, que correspondem à cerca de 15% dos muçulmanos do mundo, o sucessor do profeta deveria ser o seu parente mais próximo. Ou seja, Ali, que era primo, filho de Abu Talib (tio de Maomé), e genro de Maomé, casado com Fátima, a única dos descendentes do profeta que chegou a fase adulta. Na opinião dos sunitas, grupo que corresponde à maioria dos muçulmanos, “qualquer fiel poderia ser um candidato adequado, desde que fosse consensualmente aceito pela comunidade”1.
Os quatro primeiros califas ou sucessores estavam entre parentes de Maomé ou entre os primeiros convertidos ao Islamismo. A estes são atribuídas várias conquistas militares, formando, assim, o vasto Império Árabe que compreendia os territórios da Argélia Ásia Menor, Egito, Espanha, Índia, Marrocos, Mesopotâmia, Palestina, Pérsia e Síria.
O ideal pleno do Califado nunca se concretizou, a começar pela instabilidade devido a já mencionada ausência de um ato do profeta em designar seu sucessor2.



A expressão Khalifat rasul Allah (sucessor do enviado de Deus) significa que seu titular herdou todas as atribuições e poderes de Maomé com exceção, naturalmente, de sua missão profética que, convém sublinhar se extinguiu com a morte do fundador do Islamismo3.

O ideal dos Califados variava de acordo com os princípios de seus “governantes”. “Eis um resumo dos deveres do califa (...)”:

●Manter o Islam de acordo com a tradição;
●Fazer reinar a justiça;
●Proteger as fronteiras;
●Aplicar as penas que a lei prescreve contra os transgressores ;
●Impedir as incursões inimigas colocando tropas nas fronteiras;
●Combater os infiéis que rejeitam as exortações do Islamismo até que se convertam ou se tornem tributários;
●Cobrar taxas segundo as prescrições corânicas;
●Regulamentar as despesas públicas;
●Designar pessoas honestas e competentes para os cargos públicos;
●Manter a administração e todos os negócios de Estado sob sua estreita vigilância pessoal4.

Das divergências entre xiitas e sunitas surgiram interpretações próprias da Sharia,(Char’ia ou Xariá) que “significa “caminho para o oásis”, ou seja, o caminho correto para a conduta humana, que foi mostrado por Deus ao homem” (NOTAKER, GAARDER, HELLERN, 2005, p.141). O Direito Muçulmano não pode ser pensado assim como o Direito Romano-germânico que vigora no Brasil, no qual a política tem de ser pensada a parte das concepções religiosas. Para os muçulmanos as concepções éticas, políticas e religiosas estão intrinsecamente ligadas. A Sharia se expressa no Corão, este é mais que um texto religioso, onde contém instruções rígidas sobre questões políticas, econômicas e sociais. Se o Livro Sagrado não for o suficiente para a resolução de problemas os muçulmanos se voltam a sunna, relatos sobre a vida de Maomé e os califas (escritos nos primeiros séculos após a morte do profeta). Recentemente as trocas culturais entre Ocidente e Oriente promoveram uma série de mudanças que resultaram no surgimento “de um sistema legal com dois níveis: a lei sagrada, que se aplica sobretudo aos assuntos particulares, e o direito público, que é secular” (Op. Cit). A oposição entre xiitas e sunitas não fez com que os primeiros rejeitassem a sunna do profeta, isto é, as tradições atribuídas a Maomé. Ao contrário, embora o nome sunita seja ordinariamente aplicado aos muçulmanos ortodoxos, pôde-se notar que os xiitas são mais ‘sunitas’ que os próprios sunitas. O xiita fundamenta a sunna somente na autoridade dos familiares de Maomé enquanto que o sunita ortodoxo admite também os testemunhos dos companheiros do profeta. Cabe ressaltar que as coletâneas das tradições sunitas (hadith) e as xiitas (akhbar) possuem inúmeras tradições em comum porém se diferem pelos agentes de transmissão5.



Referências Bibliográficas:

DEMANT, Peter. O Islã no tempo. In.: O Mundo Muçulmano. São Paulo: Contexto. 2004
GAARDER, J; HEERN, NOTAKER, H.O Livro das Religiões. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.
GIORDANI, Mário Curtis. História do Mundo Árabe Medieval. Petrópolis: Vozes, 1976.
SOUZA, Osvaldo Rodrigues. História Antiga e Medieval. São Paulo: Ática, 1981.
<http://ultimosegundo.ig.com.br/paginas/hotsites/atentado_ny/conflito.html#6L> Acesso em 04 de nov. 2007.
<http://islam.org.br/os_califados_%20e_dinastias.htm> Acesso em 04 de nov. 2007.
<http://dn.sapo.pt/2007/01/06/opiniao/saddam_sunitas_e_xiitas.html> Acesso em 04 de nov. 2007.
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u97494.shtml> Acesso em 04 de nov. 2007.
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_comparado> Acesso em 04 de nov. 2007.
<http://www.dcs.shef.ac.uk/~lucia/big_photos/London/BritishMuseum_Qur> Acesso em 04 de nov. 2007.








1 DEMANT, Peter. O Islã no tempo. In.: O Mundo Muçulmano. São Paulo: Contexto. 2004. p-38.
2 GIORDANI, Mário Curtis. História do Mundo Árabe Medieval. Petrópolis: Vozes, 1976.p-155
3 Ibidem.
4 Ibidem. p-156 e157.
5 Ibidem. p-345 e 346.

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